Esta obra foi difundida com diferentes títulos:
Libro de las tres creencias (
o las tres gracias);
Libro declarante; Declaración del Credo, Camino de la verdad, etc. No entanto, em nenhum dos manuscritos figura o nome exato do autor. Essa circunstância fez com que surgissem diferentes teorias sobre a autoria da obra; uma delas é a atribuição hipotética ao frei mercedário Pedro Pascual (finais do século XIII). Por outro lado, há pesquisadores, como Menéndez Pidal, que sustentam que o Libro declarante foi escrito por Abner de Burgos com base nas atribuições textuais e extratextuais que se encontram nos manuscritos B (Ms H-iii-3 da
,Biblioteca de San Lorenzo de El Escorial, e C da
,Biblioteca Nacional de Madrid ,MS 9302), ainda que seja mais provável que o autor tenha sido o converso Alfonso de Valladolid (s. XIV).
O texto apresenta-se como um extenso sermão destinado a provar, por meio do comentário do Símbolo Apostólico, a defesa dos dogmas cristãos (o Messias, a Trindade, a Encarnação, os sacramentos, e a divindade de Jesus) frente às abordagens e objeções dos judeus e, em menor medida, dos muçulmanos. Esse tipo de argumento faz com que a obra seja uma comparação das três religiões monoteístas a partir de textos citados em latim, castelhano e hebraico traduzido.
A ideia inicial, como ponto de partida, é o Credo, como ocorre com a
,Explanatio symboli apostolorum, de Ramón Martí, escrita no ano de 1257, de um
,Capistrum iudaeorum, composto dez anos depois. Esse Credo é composto de doze artigos, cada um deles formulado por um dos doze apóstolos, testemunhas muito confiáveis pelo seu dom das línguas, por sua santidade e capacidade para realizar milagres. O conteúdo de cada um desses artigos é confirmado por referências do Antigo Testamento, principalmente do
Saltério, e das profecias de Isaías, Jeremias e Zacarias, embora existam alguns textos de Ezequiel, do Êxodo e do Cântico dos Cânticos. Todas essas citações são apresentadas em versão trilíngue: hebraico (traduzido em caracteres latinos), latim e castelhano. Esses artigos são sempre confrontados aos argumentos e objeções postos pelos judeus e muçulmanos. Em suma, o tratamento dos quatro primeiros pontos da argumentação (
Eloym entendido como uma pluralidade; Cristo, filho de Deus, Cristo concebido pelo Espírito Santo; Cristo crucificado, morto e sepultado) é muito mais extenso do que os restantes.
Após o comentário do Credo, o tratado oferece outros argumentos complementares: uma demonstração de que Deus é trindade; uma resposta a três objeções judaicas relativas ao Messias, pela qual se demonstra que o Messias é filho de Deus, que já veio e que trouxe uma nova Lei; uma exposição dos sacramentos cristãos (o batismo, a unção e a eucaristia) e, finalmente, algumas especificações relativas à ideia da Encarnação, nas quais se coloca em relevo a humildade de Cisto ao assumir a forma humana, enquanto se exalta a pureza da Virgem Maria.
Embora o tratado comece com um reconhecimento de que o judaísmo, islamismo e cristianismo compartilham a crença em um só Deus, imediatamente afirma que a autêntica Lei divina é uma só. Para justificá-lo, utiliza passagens da Bíblia hebraica, a que se refere como “a santa lei”, que determina como sagrada, santa e verdadeira para todas as religiões.
A partir dessas premissas, todo o desenvolvimento do texto tem uma orientação marcadamente antissemita e apenas secundariamente antimuçulmana. De fato, as citações do Antigo Testamento são constantes, ao passo que o Alcorão só é invocado em uma ocasião, precisamente para confirmar a ideia de que Maria concebeu do Espírito Santo de Deus, embora os muçulmanos neguem que Cristo seja filho de Deus e que tenha morrido na Cruz.
A intenção do
Libro declarante, segundo indica o próprio autor, é a de “testificar” que só existe uma única fé, utilizando quarenta e cinco provas da Bíblia. O autor usa como base para provar suas asserções o fato de que a fé islâmica, a judaica e a cristã são monoteístas. Segundo o autor:
Quer vos provar cada verso desta ciência que disseram com quatro e cinco provas da santa lei que o nosso senhor deus nos enviou com Moisés e com todos os outros santos profetas que todos vós, cristãos, mouros e judeus outorgardes que é santa e verdadeira, na qual mentira não há. (2v, MS P.iii.21).
É uma declaração extensa e detalhada das razões pelas quais Jesus de Nazaré é a resposta às profecias da Bíblia, e não uma exposição das diferenças litúrgicas e canônicas entre o Islã, o judaísmo e o cristianismo, como declara o autor. Ao longo da obra, enumera as razões pelas quais, de acordo com seu critério, o povo judeu deve renunciar a “sua obstinação e cegueira” e aceitar o Messias dos cristãos como seu verdadeiro salvador.
Utiliza estratégias que geralmente seguem o estilo das novas estratégias retóricas antijudaicas que começaram a se ampliar pela Península Ibérica após a
Disputa de Barcelona e que se popularizariam no século XIII com a publicação do
Pugio Fidei Christianaei, escrita em latim e hebraico pelo dominicano hebraísta Raimundo Martí, uma das obras polêmicas cristãs mais extensas e sofisticadas que se escreveu na Idade Média e que inclui citações talmúdicas e rabínicas.
Em conclusão, todos os argumentos da obra pretendem convencer a sua audiência de que a fé cristã é a única fé herdeira da tradição abraâmica e que Jesus é a resposta às profecias dos profetas. Pretendia demonstrar à população judaica que o cristianismo era “a fé verdadeira”. Com efeito, os conversos começaram a usar o seu conhecimento dos argumentos existentes nos livros sagrados do judaísmo, como o
Talmud ou o
Midrás, para justificar sua nova fé sob a infraestrutura da tradição polemista apologética de
Adversus Iudaeos.